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Voz materna acalma coração de bebês prematuros.

Após o nascimento dos filhos gêmeos e prematuros, um cientista americano, sem querer, descobriu a possibilidade de evitar problemas cardiorrespiratórios dos bebês da forma mais simples: gravando a voz da mãe para os bebês ouvirem. É não é que deu certo?

Se você clicou nesta reportagem esperando ler mais uma pesquisa, prepare-se para descobrir também uma linda história. Há quase cinco anos, o neurocientista americano Amir Lahav se tornou pai de gêmeos prematuros nascidos com 25 semanas. Os bebês pesavam pouco mais de 500 gramas cada um.

O nascimento dos filhos mudou não só a vida de Lahav, mas também os rumos de sua pesquisa. O cientista, que estava acostumado a trabalhar com adultos, deixou seu instinto paterno falar mais alto e procurou o chefe da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Brigham, em Boston, nos Estados Unidos, onde os bebês estavam internados. Perguntou a ele se poderia colocar uma gravação com a voz de sua esposa perto das crianças. A expectativa de Lahav era que o tom suave da voz da mãe melhorasse o desenvolvimento dos bebês, e o chefe concordou com a proposta.

Em seu computador, Lahav gravou a voz de sua esposa. Na mensagem, ela pedia para seus filhos lutarem para sobreviver e serem fortes. O pai também incluiu algumas músicas tocadas no piano em um ritmo bem suave, imaginando que isso poderia ajudá-los a relaxar. Ele ainda modificou o som para que se assemelhasse o máximo possível aos ruídos que os bebês ouviam dentro do útero. “Nós ouvimos as ondas sonoras através do ar, os bebês estão mergulhados no líquido amniótico e ouvem o som de forma fluida, como se estivessem vivendo dentro de um caixa de som cheia de vibrações”, contou Lahav em entrevista à revista Time.

Os gêmeos pareciam gostar das gravações e os médicos e enfermeiros da UTI ficaram intrigados. Além disso, a iniciativa se mostrou terapêutica para Lahav e sua esposa. “Não foi um ensaio clínico controlado, foi apenas um pai louco tentando fazer alguma coisa pelos seus filhos. Porque, especialmente no caso de bebês prematuros, você se sente muito impotente”, confessou Lahav à publicação.

Após os gêmeos deixarem o hospital, o cientista foi até lá para agradecer ao chefe da UTI que o deixou fazer o experimento. O que era para ser apenas um bate-papo informal se tornou uma conversa séria sobre prematuridade e medicina neonatal. Atualmente, o objetivo dos médicos vai muito além de cuidar para que esses bebês sobrevivam. Eles buscam ajudar essas crianças a crescerem saudáveis, já que estudos têm mostrado que prematuros têm um risco maior de baixo QI e podem desenvolver doenças crônicas na vida adulta. Será que mantê-los próximos aos sons reconfortantes da voz da mãe ajudaria a diminuir a incidência desses efeitos adversos? Essa era a pergunta que Lahav gostaria de responder.

Como parte de um acordo, o hospital construiu o primeiro estúdio de gravação profissional dentro de uma UTI do mundo. Em seguida, os cientistas começaram um estudo com 14 bebês nascidos entre 26 e 32 semanas para descobrir se eles poderiam ser beneficiados com o som da voz materna. Eles ouviam em quatro períodos do dia a gravação da voz da mãe falando, lendo ou cantando. E, para surpresa de Lahav, sim, aqueles que ouviram a voz da mãe se mostraram menos propensos a terem paradas respiratórias ou problemas cardíacos.

Outro ponto da pesquisa foi analisar por que muitos bebês prematuros nascidos sem nenhuma lesão cerebral diagnosticada têm risco de dificuldade de aprendizagem ou problemas cognitivos e sociais durante a vida. Para Lahav, a exposição desses recém-nascidos a sons de máquinas e ruídos estranhos de uma UTI tão precocemente poderia levar a problemas comportamentais no futuro. E novamente, a voz da mãe fez diferença, em especial para bebês com mais de 33 semanas, que já processam melhor os sons. A explicação seria que ela é capaz de reduzir a liberação dos níveis de cortisol, o hormônio do estresse, da criança.

É nesse ponto que o psicobiólogo Ricardo Monezi, pesquisador do Instituto de Medicina Comportamental da Unifesp concorda com o cientista. “A voz da mãe é a primeira música que a criança ouve, é quase um mantra e, como tal, tem plena capacidade de acalmar. Dentro do útero, o som é percebido pelo corpo todo através das vibrações, assim como uma pedra que atinge a água e gera movimentos contínuos. O mesmo acontece com o bebê prematuro na UTI ao ouvir a voz da mãe. Os benefícios atingem o corpo todo”, diz.

O próximo desafio do cientista é iniciar um estudo rigoroso com mais de 100 bebês nascidos antes de 32 semanas. Eles serão divididos e apenas metade vai receber as gravações com a voz materna. Mais vale um alerta. Por mais tentador que isso possa parecer, Lahav desaconselha que esse procedimento com o gravador seja feito em casa, por causa do ajuste do volume do som. Agora, você mesma conversar com o seu filho sempre será um bem enorme para ele – na barriga ou nos seus braços. Aproveite esse momento!

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A relação entre a mãe e o bebê prematuro internado em UTI neonatal

The relationship of the mother and the premature baby in Neonatal Intensive Care Units

Por: Elisa Motta Iungano

Resumo
A psicologia e a psicanálise atribuem inestimável importância à relação primária entre mãe e bebê, importante para a construção psíquica, afetiva e social deste. Para a mulher o processo de tornar-se mãe provoca transformações profundas e abrangentes. A gestação e maternidade despertam conflitos e conteúdos inconscientes, que influenciam na qualidade da ligação que estabelecerá com o filho. É uma relação permeada de sentimentos intensos e ambivalentes. O período de gestação e os primeiros tempos após o nascimento são essenciais para a construção do vínculo e têm repercussões duradouras. A prematuridade representa uma interrupção brusca nesta interação, afetando a dinâmica familiar, gerando um afastamento precoce e diversas rupturas no estabelecimento de relação entre mãe e filho. A hospitalização prolongada pode acarretar riscos para o desenvolvimento físico e psíquico do recém-nascido. Alguns procedimentos têm sido adotados como forma de preservar a humanidade do prematuro e o contato com a mãe. O trabalho de psicologia se insere nesta área através de estratégias de avaliação, prevenção e promoção de saúde psíquica. Espera-se oferecer à população envolvida a possibilidade de conscientização e mobilização de recursos para enfrentamento da situação, a fim de alcançar a integração entre a maternidade e o contexto adverso em que ela se iniciou.

Introdução
A importância do investimento na maternidade quando ameaçada pela prematuridade é proporcional à importância atribuída à relação mãe-filho pela psicologia. Autores como Winnicott e Spitz fazem alusão ao ambiente neonatal propício ao desenvolvimento psíquico, centralizando-se na interação mãe-bebê. Teóricos como Bowlby consideram o período neonatal essencial para o estabelecimento do vínculo e desenvolvimento psíquico e emocional da criança.
Questiona-se como se estabelece esta relação quando o período perinatal é tumultuado pelo nascimento prematuro. No plano fisiológico este evento é hoje contornado com altos índices de sucesso. A vida do bebê é salva, mas o que se pode dizer dos vestígios corporais e psíquicos ao final da internação? E sobre a experiência do bebê, que teve sua vida “suspensa”, indefinida? Os investimentos afetivos sobre ele teriam também ficado em suspenso? Que transformações teriam sofrido?
Este trabalho não se propõe a descrever formas de enfrentamento padronizadas de mães e bebês prematuros, mas utilizar a experiência com esta população para buscar uma compreensão mais ampliada sobre a maternidade no contexto da prematuridade, contribuindo também para a atuação dos profissionais envolvidos.

Maternidade
O termo maternidade abrange diversas dimensões de significado. Uma das definições seria a condição de ser mãe ou a relação com o filho. Esta relação tem início antes da gestação e remete a conteúdos inconscientes arcaicos que envolvem elementos filogenéticos, culturais, familiares e ontogenéticos.
É consensual para a Psicologia a importância das primeiras relações. A mãe é considerada a principal referência emocional no início da vida. Em grande parte, todas as relações interpessoais remontam à relação primária com a figura materna*. Daí se conclui a importância do investimento nesta área.
É fundamental mencionar as transformações psíquicas que acontecem no processo de tornar-se mãe. Dentre os autores que abordaram o tema se destaca Winnicott, que descreveu o estado de preocupação primária (1956), típico do final da gravidez e pós-parto, quando a mulher dirige seu foco de atenção e investimentos para o bebê. Caracteriza este estado a regressão emocional da mãe à sua infância, que propicia a identificação com o bebê, tornando-a mais apta a compreender e atender às suas necessidades. Bydlowski (2002) e Bertrand e Palacio-Espasa (1993) abordam o funcionamento psíquico perinatal, que pode variar de uma sensibilidade contextualizada às transformações vividas até estados psicopatológicos. Para Stern (1999), a mãe entra em uma nova organização psíquica.
A dimensão sociocultural da maternidade vem sendo discutida por diferentes áreas. Confunde-se com atributos a ela associados, tais como amor, dedicação e abnegação. Frequentemente idealizados e entendidos como instintivos, intrínsecos à feminilidade, foram relativizados por estudos recentes. Maldonado (1999) faz uma revisão sócio-histórica sobre maternidade e amor materno, mostrando que tais conceitos são em parte construídos culturalmente.
A maternidade é um espaço de idealizações, expectativas e ambivalências, mas este último atributo não tem visibilidade. A gravidez é retratada como um estado de completude. Acompanhar de perto esta realidade é constatar que ela não é tão idílica, ainda que não haja imprevistos. Szejer e Stewart (1997) tratam sobre a dificuldade da separação entre mãe e bebê, mesmo em partos a termo. Mathelin (2005) ressalta que desde o nascimento o bebê não está mais no ventre da mãe e, portanto, já existe falta. Esta perda de completude é em geral parcialmente compensada pela presença do bebê ao lado da mãe.
O amor materno tem caráter narcísico. A identificação é tão forte que o despreparo do bebê para a vida pode criar uma condição insegura para que a mulher se construa como mãe. Sua estrutura psíquica contribui para que esta crise seja vivida com sucesso. Isso depende de fatores inconscientes, que podem emergir fortemente. A contextualização familiar e social e o suporte recebido podem desempenhar papel protetor.

Desenvolvimento psíquico
A compreensão dos processos psíquicos passou a abranger estudos sobre o feto. A formação do psiquismo é entendida como uma interação entre influências genéticas e ambientais. Tem sido explorada por autores como Wilheim (2003) a psicologia pré e perinatal, que aborda a possibilidade de esta interação ocorrer antes do nascimento. Considera-se que quanto mais primitivas, mais determinantes são as experiências. Cunha (2001), que defende que o cérebro é moldado pelas experiências e emoções vividas durante os primeiros anos, discute as consequências deletérias da privação do contato com a mãe para bebês pré-termo.
Grande parte dos estudos diz respeito ao recém-nascido a termo ou ao desenvolvimento pré-natal. A contradição existe quando o desenvolvimento que costuma se dar no útero é finalizado fora dele. As competências do recém-nascido não se aplicam ao prematuro, portanto, torna-se importante pensar em potencialidades, que serão ou não desenvolvidas em função dos cuidados ambientais.
Maury (1999) descreve o desenvolvimento de quatro subsistemas no feto: autônomo motor organização de sono e atenção-interação social. O último funciona somente após o estabelecimento dos outros três e alcança o amadurecimento na 36ª semana. Silva (2005) acrescenta mais um subsistema, o regulador, que engloba as estratégias usadas pelo bebê para se manter no estado de equilíbrio em meio a estímulos corporais e ambientais. Conclui-se que a relação entre mãe e bebê prematuro não pode acontecer como com um bebê a termo, com mais potencialidades desenvolvidas.
A separação entre psique e corpo é, no prematuro, bastante abstrata, já que seu aparato em desenvolvimento não tem a complexidade que permite fazer tal distinção. O estudo do seu psiquismo não pode ser dissociado da fisiologia, até porque o corpo e suas manifestações são os meios disponíveis para conhecê-lo. Quando um bebê está comprometido por sua fragilidade física, ficam prejudicadas as percepções de suas manifestações. A espontaneidade e interação limitadas restringem as comunicações com o bebê. Não é correto afirmar que a subjetividade não pode se construir neste contexto – a questão é como se dá este processo.
Golse (2003) ressalta que ao considerar o bebê como portador de psiquismo e subjetividade, é necessário admitir a possibilidade de sofrimento. A saúde neste âmbito tem características sutis. O bebê, como todo humano, tem sua história, que, aliada a suas potencialidades, o constrói como sujeito. O desenvolvimento psíquico depende de investimento afetivo, que se traduz como cuidado, maternagem ou amor parental. Para o recém-nascido não há diferenciação entre corpo e ambiente – e este em geral se concentra nos cuidados providos pela mãe (Spitz, 1979, Winnicott, 2006). A simbiose é mais importante nesta fase do que em qualquer outra da vida da criança.

Prematuridade e UTI neonatal
A neonatologia é uma ciência recente e, apesar do conhecimento sobre o processo gestacional, o nascimento pré-termo nem sempre tem causas definidas. Para Maldonado, o parto pode ser considerado um evento psicossomático, determinado “por inúmeras facetas do contexto sociocultural, da individualidade físico-psicológica da parturiente e do contexto assistencial” (1999, p.71). Mathelin (1999) aborda a prematuridade como um possível sintoma, fazendo sentido em relação à história e ao psiquismo da mulher ou família.
Assim como Winnicott enunciou que um bebê deve ser considerado como parte de seu ambiente, não é possível falar sobre prematuridade sem considerar as condições de tratamento. A UTI neonatal é um termo que carrega uma contradição, ao referir-se ao início da vida e ao risco de morte. Sobrevivência e desenvolvimento dependem do maquinário, de medicamentos e profissionais atuantes neste contexto e que se tornam o mundo do prematuro. Diferente do que acontece com bebês a termo, eles têm seus ciclos regulados por contingências diferentes de suas necessidades. Dificilmente dormem sem ser acordados, a alimentação segue horários determinados e há interferências e estímulos constantes.
Enquanto é providenciada a sobrevivência, sua vida fica incerta, com a característica fronteiriça de um ser que pode morrer, mas carrega a esperança de um “bebê em potencial”. Quando vive, alguns fantasmas resistem. As sequelas da prematuridade, os possíveis efeitos da hospitalização e o estigma de fragilidade podem ser os principais. Assim como o corpo pode ficar marcado por essa experiência primitiva, há o risco, menos observável e mensurável, de consequências psíquicas. Neste âmbito as preocupações se voltam para os cuidados contingentes (Silva, 2005), que consideram e buscam adaptar-se às características e necessidades especiais do prematuro.

A relação mãe-bebê no contexto da prematuridade
Considerando a singularidade das relações entre mãe e filho, as transformações e conflitos vividos na fase perinatal, conclui-se a importância do cuidado nas ocasiões de risco. A situação de UTI neonatal, bem como as intervenções psicológicas a serem feitas, encontra-se no limiar do profilático, pois a prematuridade e sua complexidade já estão expostas. Em vez de prevenir o sofrimento, trabalhar através dele pode trazer consciência e mobilizar recursos.
Entre mãe e bebê há um estilo próprio de interação. Quando se introduz cortes na relação, novos elementos entram em sua constituição. A mãe, que em geral atua em função da identificação com o bebê e da percepção intuitiva de suas necessidades, pode ser impedida de proporcionar e viver sensações para as quais se preparou. É possível que o prematuro não esteja pronto para viver essa interação sem se desorganizar. Suas necessidades ultrapassam as possibilidades da maternagem e seu ambiente familiar não pode se adaptar a elas.
É possível que a mãe, também prematura, não esteja preparada. Em um estado de regressão, revivendo sua posição de filha e fazendo a transição para a de mãe, passa por uma espécie de limbo. É uma realidade descrita como um intervalo, em que ela deu à luz, mas não pode “atingir a completude da função materna” (Brito e Pessoa, 2006). Não há lugar psíquico ou social para esta experiência. Existem, frequentemente, expectativas para que ela se adapte logo à situação e se aproprie deste papel, o que é impossível em muitos casos.
Como apontam Guedeney e Lebovici (1999), a hospitalização do bebê rompe uma interação de intensa afetividade. Esta interatividade se dá entre a mãe e dois bebês: o que existe em seu útero e o do seu imaginário. O nascimento prematuro corta as duas relações, instaurando outra realidade. O bebê real provoca reações intensas e ambivalentes. Diferente se atuar como receptáculo, tem características próprias e, mesmo fragilizado, comporta-se, reage e se relaciona de maneira própria, o que pode encantar e assustar. É necessário conhecer este filho e aos poucos desfazer o vínculo com o bebê idealizado, em um trabalho de luto (Camarotti, 2000).
Não somente a imagem do bebê está implicada, mas a da própria mãe. Identificada com o filho, ela pode se ver como insuficiente, produtora de um bebê falho. O investimento afetivo, necessário para a construção psíquica, é prejudicado quando o objeto no qual a mãe deve investir remete à sua imperfeição. As fantasias e significações atribuídas pela mãe aos acontecimentos perinatais podem ter influência nas representações psíquicas do bebê, da maternidade e de si mesma. A ambivalência comum a todas as gestações pode, aliada ao parto prematuro, produzir culpa.
O ambiente acolhedor exerce grande importância na proteção da mãe diante das exigências da realidade, para que ela possa ocupar-se do bebê. Porém, a falta de representação social, a necessidade de presença constante junto ao bebê e fatores emocionais podem causar o afastamento da puérpera de sua rede social, ocasionando sentimento de desamparo. A equipe médica e de apoio ocupa um lugar ambivalente em muitos casos é glorificada e vista como salvadora é frequente, porém, que apareça nas fantasias maternas como agente de separação entre ela e o bebê, substituta competente para sua função ou juiz de sua incapacidade (Druon, 1999). As necessidades do bebê podem fazer com que a mãe ocupe uma posição mais de suporte à equipe que de maternagem, acentuando esta percepção.
A tendência atual em UTIs neonatais é promover a participação das famílias e o contato precoce com a mãe, uma provável consequência do conhecimento sobre a importância do vínculo. Este tipo de medida, ainda que aconteça sob algumas limitações, tem efeitos benéficos sobre o bebê e seus pais. É possível observar a influência do investimento dos pais no desenvolvimento do prematuro. Isto não significa que haja relação direta entre tempo ou afeto dispensado ao bebê e sua recuperação. Existem fatores menos objetivos a serem observados.
Espera-se preservar mais que as funções orgânicas do bebê. A permissão e estímulo ao contato são avanços fundamentais para atribuir humanidade ao prematuro e oferecer tratamento condizente com esta condição. Não se trata de negar a prematuridade e hospitalização ou promover os procedimentos citados como solução para todos os problemas decorrentes da internação. Pensar em seus benefícios implica considerar as faltas e privações e integrá-las à história do bebê. A partir disso se pode administrar a nova realidade, fazendo uso dos recursos disponíveis e, na medida do possível, resgatando a pessoalidade. Nesta acepção, faz sentido o termo humanização.
Cuidado análogo deve ser tomado pelo profissional de psicologia nesta área. Muitas vezes a demanda é de fortalecimento da parentalidade, promoção do vínculo e alívio do sofrimento, nem sempre acompanhada do questionamento sobre as condições para que isso aconteça. Ao psicólogo que adentra na complexidade da maternidade em contexto de risco cabe não agir impulsionado pelas mesmas ansiedades e manter a postura de observação e reflexão.

Considerações finais
Foram discutidos alguns fatores da relação mãe-bebê, desencontros relacionados à prematuridade e elaborações teóricas. Podem ser interessantes interlocuções com a prática em um serviço de psicologia de uma UTI neonatal. O contato com a população retratada torna vívida a sensação da confluência primária entre mãe e filho. Realidades como a da prematuridade causam estranhamento e parecem não ter visibilidade social. É provável que não haja interesse em entrar em contato com esta problemática, por representar uma ameaça. A maioria das mães de prematuros chega a esta realidade sem qualquer conhecimento prévio, o que contribui para a mistificação e vergonha.
O abismo entre a maternidade idealizada e a prematuridade dificulta a adaptação da mãe à nova realidade. Ao mesmo tempo em que se despediu do feto em seu ventre, não teve acesso ao bebê como imaginava. Não apenas o bebê, mas tudo que é associado à maternidade é temporariamente interditado. O período pós-natal, marcado por referências desconhecidas, dificulta a apropriação do papel de mãe.
A forma como cada pessoa lida com esta situação é variável e imprevisível. Algumas mães assumem postura resignada, transferindo à equipe o cuidado com o bebê e confiando mais em referenciais científicos do que em sua percepção e saber. Frequentemente inseguras têm dificuldade em buscar seu lugar e o acesso ao filho. No extremo oposto há mães que procuram assumir todosos cuidados com o filho, rejeitando quem se interpõe entre eles. Outras parecem dominadas pelos medos de si própria, de sua destrutividade e do bebê que a lembra de sua falha.
A ambivalência presente em todas as gestações pode ter sua polaridade negativa confirmada pela prematuridade. Desejos e sentimentos destrutivos em relação ao bebê são raramente verbalizados, mas presentes nas entrelinhas do discurso de puérperas. São frequentes fantasias de que a falta de amor e desejo pelo bebê provocaram acontecimentos dramáticos. Sentindo-se culpada e impotente, a mãe pode se ver incapaz de investimentos no filho. Algumas intervenções podem mobilizar recursos psíquicos. O reconhecimento e conscientização das imagens criadas podem reconduzi-la ao real, possibilitando a interrupção deste ciclo. O trauma, então, pode ser enxergado e falado, perdendo potência. Trazer à tona o bebê do inconsciente dos pais permite que ele seja elaborado. Inscrever o bebê real no seu discurso é, por sua vez, importante para criar um lugar que permita sua existência em todas as dimensões.
A angústia não deve ser eliminada, mas acolhida, em busca de elaboração. A escuta tem grande valor, possibilitando a expressão e conscientização de medos e expectativas. Ao psicólogo não cabe introduzir na mãe os desejos da equipe, mas proporcionar espaço para que ela possa perceber e expressar os seus. Auxiliar no estabelecimento do vínculo se trata, mais que promover contato, de oferecer tempo, espaço e receptividade. O trabalho de psicologia nesta área busca a possibilidade de integração entre a maternidade e o contexto adverso em que ela se iniciou. A qualidade das relações entre mãe, bebê e o ambiente dependem desta integração.


Bibliografia
1. Bertrand, Cramer e Palacio Espasa, Francisco. Técnicas Psicoterápicas mãe/bebê. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
2. Bydlowski, M., (2002) O Olhar interior da Mulher Grávida In: Filho, C.L. Corrêa, M.C. França, P.S. (orgs.). Novos Olhares sobre a Gestação e a Criança até os 3 anos. Brasília: Ed LGE Editora Limitada. 2002. Pp. 205-214.
3. Brito, Maria Haydée Pessoa, Vera Lúcia Mendes de Paula. Um perfil da mãe prematura. In: Melgaço, Rosely Gazire (org.). A ética na atenção ao bebê: Psicanálise-Saúde-Educação. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2006. Pp. 115-123.
4. Camarotti, Maria do Carmo. De braços vazios: uma separação precoce. In: Rohenkohl, Cláudia Mascarenhas Fernandes. A clínica com o bebê. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000.
5. Cunha, Iole da. A revolução dos bebês: Aspectos de como as emoções esculpem o cérebro e geram os comportamentos no período pré e perinatal. In: Psicanalítica – a revista da SPRJ. Vol II. Nº 1. Pp. 102-128. 2001.
6. Druon, Catherine. Ajuda ao bebê e aos seus pais em terapia intensiva neonatal. In: Wanderley, Daniele de Brito (org.). Agora eu era o rei: os entraves da prematuridade. Salvador: Ágalma, 1999.
7. Golse, Bernard. Sobre a psicoterapia pais bebê: narratividade, filiação e transmissão. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003
8. Guedeney, A. e Lebovici, S. Intervenções psicoterápicas pais/bebê. Porto Alegre: Artmed, 1999.
9. Maldonado, Maria Tereza. Psicologia da gravidez: parto e puerpério. São Paulo: Saraiva, 1999.
10. Mathelin, Catherine. O sorriso da Gioconda: clínica psicanalítica com os bebês prematuros. Rio de Janeiro: Companhia de Freud, 1999.
11. Maury, Michele. Intervenções Psicoterápicas nos bebês e seus pais no hospital. In: Guedeney, A. e Lebovici, S. Intervenções psicoterápicas pais/bebê. Porto Alegre: Artmed, 1999. Pp119-133.
12. Silva, Ricardo Nunes Moreira da. Cuidados Voltados para o desenvolvimento do pré-termo na UTI Neonatal. In: Alves Filho & Trindade, Manoel de Carvalho e José Maria de Andrade Lopes editores. Avanços em Perinatologia. Rio de Janeiro: MEDSI/Guanabara Koogan, 2005. Pp.35-50.
13. Spitz, René A. O primeiro ano de vida. São Paulo: Martins Fontes, 1979.
14. Stern, Daniel N. A constelação da maternidade: o panorama da psicoterapia pais/bebê. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
15. Szejer, Myriam e Stewart, Richard. Nove meses na vida da mulher – Uma abordagem psicanalítica da gravidez e nascimento. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997.
16. Wilheim, Joanna. O que é psicologia pré-natal. 3 ed. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.
17. Winnicott, Donald Woods (1956). A preocupação materna primária. In: Winnicott, D. W. Da pediatria à psicanálise: Obras escolhidas. Rio de Janeiro: Editora Imago, 2000, p. 399-405.
18. Winnicott, D.W. Os bebês e suas mães. São Paulo: Martins Fontes, 2006

Elisa Motta Iungano Psicóloga e psicoterapeuta. Aprimoramento clínico institucional na Clínica Psicológica Ana Maria Poppovic da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) na modalidade Psicossomática do bebê e da criança: abordagem winnicottiana. Aprimoramento na área de Maternidade e UTI Neonatal no Hospital e Maternidade São Luiz Endereço para correspondência:
Rua André Dreyfus, 209.
CEP 01252-010 – São Paulo – SP
Fones: (11) 8124-4693 / (11)38727521
E-mail: e_iungano@hotmail.com
Recebido para publicação em 10/2008.
Aceito em 02/2009.
© Copyright Moreira Jr. Editora.
Todos os direitos reservados.
Indexado na Lilacs Virtual sob nº LLXP: S0031-39202009002200012

 

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Efeitos (negativos) da fortificação do Leite Humano em prematuros.

O conteúdo protéico e a fortificação do leite humano influenciam no refluxo gastroesofágico em recém-nascidos prematuros.

Aceti A, Corvaglia L, Paoletti V, Mariani E, Ancora G, Galletti S, Faldella G.

JPGN 49:613–618, 2009

OBJETIVOS: Afirma-se que o leite humano (LH) pode não fornecer energia suficiente e nutrientes para os prematuros, e que precisa de ser fortificado para isso. Nosso objetivo foi determinar se o teor de gordura, teor de proteína, e a osmolaridade do LH antes e após da fortificação pode afetar o refluxo gastroesofágico (RGE) em prematuros sintomáticos.

MÉTODOS: O refluxo gastroesofágico foi avaliado com impedância intraluminal (pH-MII) em 17 prematuros sintomáticos alimentados somente com LH e com LH fortificado. A gordura do leite materno e o teor de proteína foram analisados por near-infrared reflectance. A osmolaridade do leite materno foi testada antes e depois da fortificação. Os índices de refluxo gastroesofágico foram comparados antes e após a fortificação e foram relacionadas com o teor de gordura, proteína e osmolaridade antes e após a fortificação.

RESULTADOS: Uma correlação inversa foi encontrada entre o conteúdo de proteína do LH e o índice de refluxo ácido (RIpH: P = 0,041, rho =- 0,501). Depois da fortificação a osmolalidade ultrapassou muitas vezes os valores recomendados para a alimentação infantil, além disso, aumentaram os índices de refluxo não ácido (p<0,05).

CONCLUSÕES: O conteúdo protéico do LH pode influenciar no RGE em prematuros. A fortificação padrão do LH pode piorar os índices de RGE e, devido à extrema variabilidade na composição do LH, pode-se superar a ingestão recomendada de proteínas e ultrapassar a osmolalidade recomendada. Assim, uma fortificação individualizada, com base na análise da composição do LH, poderia otimizar tanto o consumo de nutrientes quanto a tolerância a alimentação.

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MÉTODO CANGURU – Manual Técnico de Humanização ao Recém Nascido de Baixo Peso.

imagem capa da apostila

Este manual integra o conjunto de medidas adotadas pelo Ministério da Saúde com o objetivo de promover a humanização do atendimento perinatal e apoiar a expansão do Método Canguru no País.
A base do manual é a Norma de Orientação para a Implantação da Atenção Humanizada ao Recém-Nascido de Baixo Peso – Método Canguru (Portaria 1.683 de 12 de julho de 2007, MS), que é parte importante dos esforços dirigidos a propiciar uma atenção de qualidade, humanizada e individualizada às gestantes, aos recém-nascidos e às suas famílias.
Um dos pilares desses esforços é o Programa de Humanização do Pré-Natal e Nascimento (PHPN), instituído pelo Ministério da Saúde em junho de 2000, que tem como principal estratégia garantir a melhoria do acesso, da cobertura e da qualidade do pré-natal e da assistência ao parto e ao puerpério. Esse programa amplia as ações já adotadas na área pelo Ministério da Saúde, como os investimentos nas redes estaduais de assistência à gestação de alto risco e o incremento do custeio de procedimentos específicos.
Outra estratégia adotada pelo Ministério da Saúde é a Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC), a qual vem contribuindo para a qualificação da atenção ao recém-nascido desde 1992, época de seu lançamento no Brasil.
Complementando essas providências, a Norma de Atenção Humanizada ao Recém-Nascido de Baixo Peso, já referida, reúne conhecimentos acerca das particularidades físicas e biológicas e das necessidades especiais de cuidados técnicos e psicológicos do casal grávido, da gestante, da mãe, do pai, do recém-nascido de baixo peso e de toda a sua família. Abrange também a equipe de profissionais responsável por esse atendimento, buscando motivá-la para mudanças importantes em suas ações como cuidadores.
Resultado de trabalho intenso realizado pelo Ministério da Saúde, com o apoio de consultores, este manual demonstra que é possível prestar uma atenção perinatal segura, de elevada qualidade e, ao mesmo tempo, solidária e humanizada.

faça download do manual completo:  apostila método mãe canguru

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Bancos de leite do Brasil são referência mundial.

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No método brasileiro, cada vidro de leite específico recebe um número e um programa de computador procura entre todas as doações a que melhor atende à necessidade de cada criança. Não há mistura.

Uma técnica desenvolvida em bancos de leite materno do Brasil está ajudando na recuperação de bebês prematuros em outros países.

O leite que sobra depois da mamada é recolhido uma vez por semana no Rio pelo carro do Corpo de Bombeiros. Em Niterói um carro do Hospital Universitário Antônio Pedro faz a coleta.

Em Vitória no Espírito Santo é a Polícia Militar que leva as doações. A boa vontade é igual a do resto do mundo, mas as semelhanças param por aí.

Chegando aos bancos de leite brasileiros, as doações encontram laboratórios duas décadas à frente dos bancos de leite dos países mais desenvolvidos do planeta.

Nos Estados Unidos, por exemplo, todas as doações são misturadas em uma espécie de panelão.

Depois de passar por um tratamento térmico, o leite padronizado é distribuído em garrafinhas, com uma perda irreparável.

“Se perde a oportunidade de exatamente explorar as especificidades porque na verdade não existe leite humano, existem leites humanos e esse é o grande diferencial”, afirmou o coordenador da Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano, João Aprígio de Almeida.

No método brasileiro, cada vidro passa por uma análise simples, mas reveladora: quanto mais rosa, maior a acidez da amostra.

Basta girar na centrífuga uma quantidade menor do que uma gota de leite para ver a faixinha escura que diz quanta gordura existe no leite. Em menos de 15 minutos, as diferenças aparecem.

Cada vidro recebe um número e um programa de computador procura entre todas as doações a que melhor atende à necessidade de cada criança.

O resultado da técnica, desenvolvida por pesquisadores brasileiros, impressiona: em todos os casos, as crianças se recuperam muito mais rapidamente do que quando se usa leite materno misturado, como acontece nos Estados Unidos e em vários países da Europa. A tecnologia do Leite-remédio virou referência mundial: 22 países montaram seus bancos de leite com a ajuda do Brasil.

O próximo país a adotar essa tecnologia do leite materno vai ser a Espanha já no próximo mês.

Fonte: globo.com